Em plena Olimpíada Rio 2016, o nosso futebol foi posto a prova mais uma vez e, com isso, uma grande discussão sobre diferenças de gênero no esporte surgiu. Marta sempre foi um ícone do futebol feminino, mas diversas vezes se viu esquecida pelo seu público. No entanto, nesse Rio 2016 ela foi imensamente idolatrada.
Os primeiros jogos de futebol masculino não tiveram êxito. O Neymar, que é o nosso craque tanto em terras brasileiras, quanto em terras europeias, parecia estar apagado e isto o público não perdoou. Já no futebol feminino tivemos gols e um 5×1 que se prolongasse mais um pouco poderia virar o 7×1 que os nossos craques levaram na Copa do Mundo 2014. Com isso, surgiu o questionamento: Marta seria melhor que Neymar? Este é um questionamento muito interessante a se pensar, mas o que eu quero levar em consideração é: até que ponto um atleta é visto como campeão?
Apesar do deslize nas primeiras competições, o nosso futebol masculino foi campeão olímpico e, com isso, Neymar ressurgiu como herói. Enquanto isso, o nosso futebol feminino perdeu e de heroína, Marta começou a ser esquecida novamente. Apesar do grande apoio que as nossas meninas receberam nas redes sociais, uma questão foi levantada recentemente e pouco se tem falado sobre.
A CBF discute extinguir a seleção de futebol feminino permanente porque, como foi divulgado no Globo Esporte, um dos principais dirigentes da instituição teria afirmado que o futebol feminino não “pega” no país. Com isso, eu te pergunto: que incentivo temos? Bom, mas continuando, o argumento seria que o resultado do time não foi o esperado e agora vai restar apenas “a conta para pagar”. Assim, eu te pergunto novamente: e o 7×1 que levamos na Copa do Mundo 2014, não tiveram que pagar também? Aí você me responde que o prejuízo foi muito menor e eu te respondo: eu sei. A questão é: quando falamos de diferença de contas, falamos em que?
Entenda as diferenças de gênero no mercado esportivo
Todo esse questionamento nos leva à questão de gênero que abordei no começo deste artigo. O rótulo de campeão faz parte dos atributos da marca de um atleta e isto você pode entender melhor aqui. No entanto, diante dos acontecimentos, vemos que há uma oscilação na constância deste rótulo. Vejamos: o Neymar é um herói e com um deslize ele virou um anti-herói, para depois com um acerto virar um herói novamente. A Marta também sempre foi uma heroína e mesmo com um deslize continuou sendo aplaudida, mas logo foi esquecida. Se isto fosse uma novela, podíamos dizer que o Neymar é o personagem principal e a Marta a coadjuvante. E isto é o espelho do nosso mercado esportivo.
Sempre falam de diferença de salário entre homem e mulher, mas também há a diferença de patrocínio, a diferença de público nos estádios, as premiações nas competições, entre outros. De acordo com a página Caneta Desesquerdizadora, Marta recebe $400.000,00 por ano (R$ 1.300.000,00) e isto equivale a um salário superior ao de 99,6% dos jogadores de futebol masculino que atuam no Brasil. Parece muito? Sim, mas você sabia que este salário é pago pelos seus patrocinadores Coca-Cola e Puma? O clube em que Marta atua, o FC Rosengård da Suécia, não paga nenhum salário à atleta porque o futebol só atrai cerca de 1.000 pagantes por jogo no país.
Ainda de acordo com a página Caneta Desesquerdizadora, o “principal campeonato de futebol feminino no mundo, o americano, chegou a ser cancelado em 2012 por falta de interesse”. Além disso, no Brasil, a final do campeonato brasileiro feminino de 2016 entre Rio Claro e Flamengo aconteceu sem cobrança de entrada e mesmo assim teve cerca de 500 pessoas no estádio. Enquanto isso, o salário que Neymar recebe no Barcelona nem sequer é sua principal fonte de renda. Sua principal fonte de renda são contratos publicitários e patrocínios, que lhe rende cerca de 22 milhões de dólares por ano. E o Barcelona tem a maior média de público da Espanha e da Europa, com uma média de 78.881 pessoas pagantes por jogo. Pensando assim, realmente vemos que o prejuízo do futebol feminino para a CBF é muito maior do que qualquer 7×1 para o futebol masculino.
Infelizmente, este é o nosso mercado esportivo e ainda temos muitas diferenças de gênero no nosso esporte, como também temos dificuldade em dar uma constância para o rótulo de campeão que damos aos nossos atletas. A diferença entre Olimpíada e Paraolimpíada também é outra questão a ser levantada, mas fica para a próxima. Enquanto isso, que não falte o incentivo, que possamos enxergar mais Martas no nosso esporte e que não sejam esquecidas. “Não deixem de apoiar o futebol feminino”, disse Marta. Ok, nós não deixaremos!
*Camille Reis